quinta-feira, fevereiro 17, 2005

O Debate Final (mais vale tarde...)

O Debate Final...Titulo a roçar a ficção cientifica.Talvez um sinal do que se avizinhava...
Ainda actual apesar de já ter dois dias de distância.
O debate que todos esperávamos, para não variar, ficou aquém das expectativas.Mas o que perdeu em termos de esclarecimento para os indecisos (grupo de que felizmente, se já não fazía parte, ainda menos faço neste momento...), ganhou em termos de "espectáculo" televisivo.Sempre é melhor que a "Cabocla" ou os batanetes e afins.
Mas já lá vamos.
Antes não será demais referir o verdadeiro "circo" que se gerou um torno do falecimento da nossa "vidente" de Fátima (como insistentemente foi chamada em todos os blocos noticiosos) e os efeitos que produziu na campanha eleitoral em si. Sem desrespeito por quelquer crença ou convicção, a cobertura que foi dada em todos os canais de sinal aberto (excepção feita à 2) às exequias funebres da falecida foi manifestamente exagerada.Que tipo de serviço público será esse?Fica a pergunta...
Depois ficou também o episódio do cancelamento de toda e qualquer actividade na campanha do PP, acompanhado depois pelo PSD, o qual ainda em funções governativas, resolveu estender o luto do seu partido a todo o país que, apesar de maioritariamente cristão, com certeza não comungará os mesmas ideais pessoais e religiosos do nosso Primeiro-Ministro. Uma consulta aos artigos iniciais da Constituição da República Portuguesa seria proventura útil...Aquela parte..."O Estado Português é laico..."
Mas a trama adensa-se...Veio depois o "devoto" quase-ex-ministro da Defesa e do Mar fazer questão de estar presente no último adeus, acabando por o fazer numa cerimónia onde supostamente só familiares e pessoas íntimas estariam presentes, e onde queria permanecer discreto (apesar de todos os jornais do dia seguinte referirem o facto...), o que lhe valeu críticas que indiciavam tentativa de aproveitamento político, o que o seu gabinete veio de imediato desmentir, acompanhado de um suposto sobrinho da falecida, aparentemente quem lhe facultou a entrada na cerimónia...
Finalmente o debate...Houve de tudo para todos os gostos.Houve coitadinhos brigões, discursos vácuos, discursos seguros, drama e até espionagem e surpresas bombásticas.
Antes de mais, uma palavra para os moldes em que este conceito de debate foi levado a cabo. O tempo sobrepõe-se às ideias e à fluência destas e, embora se ganhe ao nível da organização e da ausência (embora não total...) de interrupções constantes, perde-se nitidamente ao nivel da abrangência dos temas postos na mesa, demasiado redundantes e limitativos, deixando de parte áreas de suprema importância como o nosso futuro na Europa e quais as orientações a dar à politica externa, a agricultura ou os problemas cada vez mais agravados de escoamento no sector textil.
Saíram a ganhar, nitidamente, os partidos normalmente menos expressivos na urnas. Os pontos mais negativos de um debate que se pretendia o mais pluralista possível foram, infelizmente e como já vem sendo hábito, o modo como se focalizou na revisão do passado recente e já não tão recente (o já inevitável "pântano" deixado pelo PS e as "culpas no cartório" imputadas a PSD e PP) e na discussão entre PSD e PS sobre fait-divers e acusações avulsas, de onde ressaltou a falta de lucidez e concisão no discurso, que sobrou no BE e no PP. Por outro lado, faltou também uma outra visão de questões específicas e problemas que nem sequer foram aflorados, e que Jerónimo de Sousa poderia ter contribuído para trazer a lume, como o fez na única intervenção perceptivel que logrou fazer.
Santana surgiu diferente do debate a dois, "jogando à defesa" e limitando-se a defender dos ataques que lhe eram dirigidos, contra-atacando em vez de procurar fundamentar as decisões tomadas e a tomar, sendo facilmente anulado por Sócrates e Louçã. A parte da espionagem surge quando Judite de Sousa relembrou, referindo-se a uma recente entrevista televisiva em que Santana refere um alegado "acordo secreto" entre PS e BE...O discurso final, que anteriormente tinha desequilibrado a balança a seu favor revelou-se, desta vez, insuficiente para tal efeito.
Sócrates não foi capaz de justificar em discurso a maioria que insistente e incessantemente pede, procurando antes utilizar o método da repetição à exaustão da ideia da "mudança necessária para mudar o rumo das coisas" para procurar persuadir os ainda indecisos, para os quais dirigiu a sua intervenção final. Poderia ter saído facilmente vencedor mas confirmou antes a sua dificuldade em lidar com o meio televisivo.Quanto às ideias expressas, poucas novidades foram apresentadas sendo, no entanto, evidente um quase consenso com o BE, havendo apenas uma pequena discussão relativa à segurança social.
Portas, como é seu apanágio, conciso e bem preparado, surge com um discurso coerente, embora um pouco risível em certas ocasiões, nomeadamente quando apresenta provas estatísticas da possibilidade de "roubar" mandatos parlamentares ao PS como justificação para os alegados ataques de que vem sendo alvo por parte do líder socialista, argumento desmontado pelo próprio moderador, relembrando-lhe o método de eleição dos deputados pelos seus circulos eleitorais, ou quando dirige o seu discurso à classe média, sendo o PS quem lhe relembra o congelamento de salários e lhe aponta a co-responsabilidade pelos erros do Governo.
Louçã, seguro e "com conhecimento dos dossiers" protagonizou o melhor momento do debate, ao deitar por terra o que previsivelmente seria o principal alicerce do discurso de PSD e PP:o combate aos grandes interesses instalados, principalmente da banca e da chamada "alta finança".Fê-lo comprovando documentalmente uma alegada isenção fiscal a uma fusão de balcões do grupo Santander (apesar de legal, bem comprometedora...), acusação de que Santana procura defender-se relembrando casos similares no Governo PS. Louçã remata dizendo que os erros não se tornam justificáveis pelo simples facto de serem repetições do passado. Portas inteligentemente não se pronunciou sobre a questão, deixando o companheiro de coligação dar o já tradicional "tiro no pé" sozinho.
A coligação à esquerda no caso de maioria relativa do PS foi novamente centro das atenções com Sócrates a repetir o já repetido e Louçã a abrir a porta a "acordos parlamentares".A frase enigmática de Portas ficou também no ar quando refere também ter direito a não antecipar cenários políticos que lhe sejam desfavoráveis...mas daí a extrapolar que o PP não fecha a porta a acordos pós-eleitorais à esquerda vai alguma distância.
Em suma, nada de novo se tirou de praticamente 2 horas de debate.O que se espera é que não tenha contribuído para o aumento exponencial da abstenção, já que o interesse demonstrado pelas audiências foi inequívoco.Supostamente terá sido o programa mais visto na televisão pública nos últimos 4 anos...
Ontem, no momento do dia, Santana finalmente assina o célebre "contrato com os portugueses". Uma cópia era bem vinda..nem que seja com assinatura digital semelhante à do milhão e meio de cartas a pedir o favor ao humilde votante de fazer justiça votando, para que continue a luta contra os grandes interesses instalados...
Haja lucidez e bom senso no domingo e que ganhe o melhor!