sábado, novembro 08, 2008

Ornette Coleman, Coliseu do Porto, 7 Novembro 2008


O pai do free-jazz esteve finalmente no Porto e eu tive a felicidade de, na melhor companhia possivel (há surpresas cujo valor é incalculável... :) ), conseguir finalmente vê-lo no seu habitat natural:o palco.
Pequeno, aparentemente frágil, acompanhado por uma banda de 1ª qualidade (com o filho Denardo Coleman na bateria e dois baixos: um contrabaixo (que também foi usado com arco num tema inesquecivel que, partindo de uma das mais conhecidas suites de Bach, a desconstrói como só Ornette é capaz...) assegurado com brilhantismo por Anthony Falanga e um baixo eléctrico tocado por Albert Mcdowell), Coleman usa o trompete, o sax e o violino a seu belo prazer e sem pré-aviso vai alternando instrumentos.
A combinação é desconcertantemente harmoniosa, mesmo quando o free mais "duro de roer" se instala, porque cada músico parece saber exactamente para onde se dirige o seu fraseado e todo o quarteto vai evoluindo a cada tema de forma solta e imprevisivel, mas não menos bela e emocionante, porque prende e conquista quem ouve, à espera de saber onde desembocam os 4 caminhos paralelos e só aparentemente dissonantes.
O próprio Coleman recusou desde sempre o rótulo de free jazz associado à sua música, pois apesar de esta priveligiar a liberdade de expressão e criatividade de cada músico, sem qualquer tipo de hierarquia ou voz de comando, resulta de um elaborado trabalho de composição e interpretação, o que não corresponde propriamente a "free". O método que criou para compôr baptizou-o de "harmolodics" embora actualmente o tenha renomeado "Sound Grammar", precisamente o título do seu mais recente álbum, que lhe valeu um Pullitzer e uma nomeação para os Grammys.
Mas voltando ao espectáculo em si, Coleman actuou 1h30 sem paragens, sempre com igual intensidade (não se nota no seu sopro as mais de sete décadas de vida que já carrega), entrega e a imprevisibilidade no fraseado que sempre foram a sua imagem de marca.
Depois da "standing ovation" de um Coliseu rendido, seguiu-se uma pequena prenda: um encore com o clássico "Lonely Woman", para fechar em beleza. Só faltou mesmo Don Cherry para acompanhar com o seu mini-trompete...
Acendem-se as luzes...custa regressar à vida real depois de sentir a genialidade tão de perto.Ficou um autógrafo para perpetuar na memória momentos que dificilmente se repetirão...


Video do ano passado quando passou pela Gulbenkian...a tal suite de Bach também fez parte do cardápio...