quarta-feira, junho 08, 2005

a cultura da europa (e a europa da cultura)

A França foi a primeira a dizer "não!". Correu mal. Depois a Holanda, e a coisa correu pior do que se podia imaginar. Porque de dois fundadores se trata. No fundo uma questão de táctica: ou se tinha agendado um dia único para todos os referendos (um dia que lhe merecesse, à UE, a mobilização de todos: impossível, a utopia da europa, talvez), ou se deixava a classe paterna para o fim (havia menos estragos, é certo, mas seria muito pouco honesto, sem perdão). A ironia do calendário (e dos resultados) dos referendos fala mais alto, como que afirmando a distância entre o povo, os seus próprios parlamentos, e as entidades europeias.
De facto não cabe a cada governo amamentar o conhecimento de cada um com serviços personalizados de informação: a cidadania deve ser exercida de forma activa e não passiva. Não sei se os governos (e respectivas oposições) terão a noção da incultura que paira sobre os seus países. A questão é que enquanto não forem criados hábitos culturais nunca haverá interesse em conhecer ou participar em desafios como a Europa. E assim se corre o risco de, nos sucessivos referendos europeus, haver um chumbo à iniciativa em causa, muito menos por decisão informada e ponderada, do que, por exemplo, por votos de protesto a questões internas a cada país que pouco têm que ver com a questão em causa - e que se tornam num objecto de fácil apropriação como causa eficaz que justifica a decisão.
É perverso que os partidos, e falo do caso português, se acomodem à fidelidade do seu eleitorado e tornem os assuntos europeus numa espécie de tabu. Quem deve informar não informa nem apela à informação, não promove, mas critica o desinteresse. Não há debate, a informação só está na internet a que muitos simplesmente não têm acesso, ou falta o tal hábito da informação. O desfasamento entre a realidade de um país "tecnologicamente chocado" e a do país real é proporcional ao nível de abstenção nas urnas e também já antes delas. E os responsáveis, tanto por isto, como, por imediata correspondência, pelas "contrariedades" nas questões europeias, são os governos e só os governos.