quarta-feira, abril 27, 2005

a piscina

Passados muitos anos (8,9,10...?) regressei à piscina. A dois passos de casa regressei à touca, aos chinelos, ao cloro e à imensidão daqueles 25 metros de água. De vez em quando o mesmo homem que se agacha e colhe água para o controlo. O mesmo tecto quando nado de costas. O mesmo burburinho, os mesmos berros profissionais dos treinadores. É bom voltar aos tempos adolescentes e reparar que afinal, nem tudo se perdeu.

(fotografia do filme Tuvalu, onde em tempos existiu uma piscina)

segunda-feira, abril 25, 2005

31 anos

Não resisto voltar a esta canção. Porque este é o dia. E porque esta é a canção.


Venham mais cinco
Duma assentada
Que eu pago já
Do branco ou tinto
Se o velho estica
Eu fico por cá

Se tem má pinta
Dá-lhe um apito
E põe-no a andar
De espada à cinta
Já crê que é rei
Dàquém e Dàlém Mar

Não me obriguem
A vir para a rua
Gritar
Que é já tempo
D'embalar a trouxa
E zarpar

A gente ajuda
Havemos de ser mais
Eu bem sei
Mas há quem queira
Deitar abaixo
O que eu levantei

A bucha é dura
Mais dura é a razão
Que a sustem
Só nesta rusga
Não há lugar
Pr'ós filhos da mãe

Não me obriguem
A vir para a rua
Gritar
Que é já tempo
D'embalar a trouxa
E zarpar

Bem me diziam
Bem me avisavam
Como era a lei
Na minha terra
Quem trepa
No coqueiro
É o rei

José Afonso

NOTA: alguma fotografia do dia, aqui e aqui.

sábado, abril 23, 2005

edição portuguesa

Óptima escolha a de quem comprar a edição portuguesa do semanário francês Courier International. Informação e reflexão sobre o mundo. Excelente para quem quiser, sem muito esforço, perceber o que nele de importante se passa. Aconselho vivamente.

no alarms and no surprises

Hoje é o Dia Mundial do Livro. O jornal informa que no Porto a Assírio & Alvim tem os livros com 50% de desconto, que na fnac de Santa Catarina se apresentam os livros do filósofo José Gil ("Portugal Hoje: o medo de existir") e a tradução mais recente de Frederico Lourenço ("A Ilíada"). Por mera coincidência existe a "Poesia em linha", realizada aos sábados até dia 30, que consiste na leitura de poemas a bordo de um eléctrico que parte, julgo, da Foz.
O Livro pede desculpa ao Porto pelo incómodo que é ter um Dia Mundial que obriga à iniciativa, à criatividade, à surpresa. No alarms and no surprises. E a vida continua...

quinta-feira, abril 21, 2005

Para consulta do projecto de lei sobre o aborto, ver aqui. Para perceber o que são 10 ou 16 semanas de gravidez, ver, por exemplo, aqui. Para julgar e sentenciar sobre o que é ou deixa de ser moral, que faça cada um por si.

Paula Rego

segunda-feira, abril 18, 2005

qualquer um menos este


Cardeal Richelieu, apontado pela imprensa estrangeira como o mais temível dos "papabili"...be afraid, be very afraid...

sábado, abril 16, 2005

Gadjo Dilo - O Estrangeiro Louco


Os Ciganos. Outro ponto de vista. Muito acima de Kusturica. De Tony Gatlif, 1997. Dos melhores filmes que vi até hoje.

o verniz

Os governantes, os políticos, esses grandes portadores e trabalhadores da verdade para o país, são cada vez mais - espelho da sociedade - a imagem que criam junto das câmaras, e assim junto de todos. É análoga a forma como essa tendência se verifica na publicidade televisionada. Apesar de ser já em si um objecto de imagem, os anúncios deixam de convencer pelo conteúdo, pela mensagem sincera e inocente sobre as vantagens na compra de certo produto. Abandona-se a ideia de que o produto será comprado pela qualidades que tem, mas antes pela qualidade do anúncio. Vejam-se os exemplos da Pepsi, da Coca-Cola ou da Peugeot e a sua originalidade e espectacularidade. São os anúncios que vencem a guerra da publicidade, não o produto - que muitas vezes sai esquecido, como comentava o Carlos há dias. A imagem é tudo. E ultimamente, dizia eu, assistimos a semelhantes construções da imagem em certos governantes, mais concretamente a governação de Santana Lopes, e mais recentemente o pós-governo, e ainda algumas intervenções de Jorge Sampaio.
A já conhecida vitimização que é permanente em Santana Lopes, requer câmaras, atenção. Primeiro uma governação esvaziada de conteúdo da qual nos fica a construção da imagem de um dom-ruan-pedro-coitadinho-santana-lopes. Depois a impertinência e o descabimento do "feriram-me mas não me mataram", e a consequente birra pelo regresso à câmara. Sempre a querer ser o centro das atenções. Melhor, a imagem dele, esvaziada de mensagem, ele como uma aparência, ele apenas a impressão boa que se quer trasmitir. Ele, o anúncio impressionante do falar de improviso, do permanente charme , do sorriso e da sinceridade, tudo de si para si, na ilusória trasmissão de qualquer mensagem verdadeira.
Por outro lado existe o conhecido parkinson decisório de Sampaio que não o afasta da construção de uma imagem a vários níveis contraditória. Já reparamos que o presidente precisa de tempo: tempo para pensar, reflectir, ponderar, para, no fundo, acalmar a mão tremente quando a decisão tem que ser tomada. E há falta de tempo? Corre mal e sai asneira - o que às vezes mesmo com tempo acontece. Já nem critico a simpatia que o nosso Presidente é sempre que se aproxima do povo, esquecendo o cargo que exerce e a influência que as suas opiniões têm em muita gente. Como aconteceu agora em França com a inocente pergunta de uma luso-descendente sobre o aborto no nosso país, à qual Sampaio simpaticamente teve que responder. Mas nem vou por aí, nem por todas as vezes em que o presidente se apanha mais distraído pelo estrangeiro e facilmente troca a farda de presidente pela de amável turista português. A tentativa da construção de uma imagem, pelo contrário, forte, firme, séria está centrada antes nos raspanetes que Sampaio prega em inaugurações ou visitas de uma presidência aberta. Na inauguração da Casa da Música o presidente, mais uma vez, não evita o sermão. Já toda a gente sabia que a Casa tinha sido muito mais cara do que o imaginado, que houve irregularidades no processo, que teve demasiados presidentes, então porquê o raspanete? E para quem? E que consequências práticas terá? Que timming é este, senhor Presidente? Então e o EURO 2004, ou a EXPO98 ou o seu CCB? Já que se mostra tão incomodado, não faria sentido uma pequena alusão aos erros cometidos no passado? Fiquei com a sensação de que os erros só foram cometidos nesta obra, e que só a partir de agora se deve sobre eles reflectir. E ficar com esta impressão num dia tão especial deixou-me muito triste. Não sei porque Sócrates não aplaudiu, mas é uma atitude exemplar de quem não quer construir imagem nenhuma e quando aparece não tem que ser hipócrita. Mas é o que temos, um presidente que vai dando murrinhos na mesa do país, convicto de que assim se resolvem os problemas. É a imagem que, mais uma vez, não corresponde ao conteúdo, é o verniz que com o tempo vai estalando.

quinta-feira, abril 14, 2005

now's the time


Casa da Música, 1999-2005-

quarta-feira, abril 13, 2005

PASTELARIA

Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício

Não é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra

Mário Cesariny

da cultura

Aborto ou Europa. É deste modo quase maniqueísta que a questão da prioridade que deve ser dada a cada referendo se têm posto. E qual dos temas o mais distantes de cada votante! O que me interessa a Europa se estou tão bem no meu país? O que é que se passa com o aborto? Não são todos assassinos, dirão uns, ou todos inocentes, dirão outros? E é assim, do mesmo modo simplista de quem passa a batata quente ou sacode a água do capote que muitos portugueses pensam sobre estas e outras questões de extrema relevância e importância.
A Europa, essa coisa abstrata que para muitos (quase todos) existe apenas no futebol, e nos subsídios. Mas então não há uma Comunidade não-sei-quê? Não, corrigi eu há tempos um colega da universidade (!), agora chama-se União Europeia, a CEE já não existe...Quem de entre a massa estudantil universitária terá a noção do que representa a revisão de um Pacto de Estabilidade e Crescimento (ou o que o próprio PEC quer dizer)? Quantos, pela invasão do Iraque pelos E.U.A., tiveram a noção da importância que teria tido uma política externa europeia coesa? Quantos continuam a achar que para se circular pelos países da U.E. é preciso mostrar o passaporte à passagem das fronteiras que já só são geográficas? A "Europa" ainda é uma nuvem, um nevoeiro...melhor: uma luz forte, para a qual se evita olhar de frente.
O aborto, uma questão diferente, mas não menos abstrata. E entre esta e a primeira duas coisas em comum: um referendo, em primeiro lugar, e uma enorme falta de cultura por parte de quem vota, em segundo. Aqui e sempre, em termos de conciencialização e de construção humana, a cultura é a questão central. Porque na cultura está a informação, claro está, mas também o hábito, a atitude de quem procura saber, de quem se dá ao trabalho de pensar e esclarecer as dúvidas que do pensamento surjam. É mais fácil, e infelizmente automática, a atitude crítica do bota-abaixo quando são, por exemplo, conhecidas propostas de perguntas para o referendo da adesão à Constituição europeia. Não há vergonha por se não perceber o nexo de duas palavras seguidas postas naquelas perguntas, cada um avança para a crítica (muitas vezes por influência das oposições políticas) sempre antes de se estudar o assunto com seriedade. A culpa é sempre dos outros, e se houver um outro abstrato como é o estado, melhor! (assim somos com os acidentes de viação que nunca podemos evitar, com os impostos cada vez mais altos aos quais saberemos sempre fugir - se não formos parvos, com os apartamentos em cima das dunas ameaçados de demolição "sem uma explicação!", etc, etc) Mas então e o estado não tem responsabilidades? Tem, pois, nem que seja para descanso dos que se exaltam pela morte da culpa solteira. Tem responsabilidades mas não é santo milagreiro. A educação deve sem dúvida ser A aposta para contrariar essa incultura. Muito mais até que a inovação tecnológica - que se tem verificado ser, ao nível na internet e dos telemóveis, um factor mais de dispersão do que de concentração de saber, onde o vício do entretenimento toma o lugar da esporádica mas intencional pesquisa ou busca do conhecimento. A cultura do hábito tem que dar lugar ao hábito da cultura. E isso deve ser passado (e não, especificamente ensinado ou incutido) nas escolas e em casa. E nos dois lugares do mesmo e exacto modo: através do exemplo! Não porão em causa que muito mais importante e positivamente marcante que estudar Gil Vicente é ter um professor de Português que seja um exemplo a seguir, um exemplo de respeito, de dignidade, de educação. Porque os professores, como os pais, é isso que têm que ser, acima de qualquer diploma ou especialidade. E isto devemos ser todos os que compomos a sociedade como lugar de interação e de relação, mas que, na generalidade, não somos. Talvez seja isto o conceito do "medo de existir" que o filósofo José Gil nos trouxe. A educação começa em casa e acaba nas escolas (na universidade, gostaríamos todos). Mas se no processo educacional todos sofrem desse "medo", se ninguém quer fazer a sua "inscrição", arriscar e deixar a sua marca, então não há soluções monetárias que o salvem. E sem educação não há cultura. E continuaremos a estar na muito citada "cauda da Europa", em vez de sermos o seu rosto no oceano de uns descobrimentos, de uns Lusíadas.

terça-feira, abril 12, 2005

Mais do mesmo?

Para gáudio de uma Direita ferida e humilhada, este fim de semana o PSD voltou à imprensa em força...Já estávamos com saudades.
O congresso foi a mera confirmação do que já se esperava: a eleição de Marques Mendes como novo secretário geral do partido.
Santana fez o bom velho discurso do coitadinho e despediu-se com um "i´ll be back" que já começa a ser um bocado aborrecido...Se há coisa que se deve saber fazer, principalmente em política, é tirar umas férias quando estamos nitidamente a mais e acima de tudo, se a nossa presença prejudica o partido...
Pelo meio ainda houve uma réstea de emoção quando se pôs a possibilidade de a moção do "outsider" António Borges ser a mais votada...mas a boa velha disciplina partidária prevaleceu sobre a não tão boa alternativa democrática (não confundir com A. D. e conceitos afins...) e venceu quem tinha de vencer embora por uma margem surpreendentemente reduzida relativamente à candidatura rival (57% vs. 43%).
Procurando desde o início "agitar as águas", talvez buscando um milagre qual Moisés no deserto a caminho da Terra Prometida, Mendes ameaçou bloquear a revisão constitucional que viabilizaria a realização simultânea do referendo europeu e das eleições autárquicas (para a qual é exigida uma maioria de 2/3 dos deputados em efectividade de funções)caso o PS insista na ideia de uma eventual consulta popular relativa à interrupção voluntária da gravidez, argumentando que o referendo europeu é uma prioridade nacional.
Será que a Direita está efectivamente receosa que uma nova consulta popular referente à despenalização do aborto vá no sentido inverso da anterior? Ou tudo isto não passa de uma "birra" (palavras de Louçã...) e um modo de tentar demonstrar que o PSD ainda conta alguma coisa na vida do País que governou com tanta eficiência e bom-senso?
Em suma, mais um congresso "para inglês ver", procurando demonstrar uma unidade evidentemente falsa num partido talvez mais fraccionado que nunca...MArques Mendes vai ter muito que fazer para arrumar esta casa cheia de pó e cacos.Que tal uma política de "Terra Queimada" like in old Russia?Se for preciso ajuda...

quarta-feira, abril 06, 2005

elogio do silêncio


Van Gogh

sábado, abril 02, 2005

as últimas horas (?)

A não-renúncia ao cargo de Santo Padre levanta várias questões. Por um lado ouvem-se Padres realçar que assim o Papa mostra ao mundo que a morte faz parte da vida dos cristãos, que nos dá um exemplo digno de velhice e de como esta deve ser encarada condignamente. Quais serão as consequências deste "carregar da cruz", que, apesar de "cruzes" em nada comparáveis, se quer a toda a força tirado do exemplo de Cristo? Por outro lado outra questão: e se a pouca saúde de Karol Wojtyla se deteriorar muito lentamente ou estabilizar mesmo num estado comatoso que se prolongue por mais alguns anos, que consequências isso tem? Teríamos nós transmissões televisivas com 12 horas por dia de directos de Roma com clero e médicos no estúdio em diárias profecias e sessões de tele-medicina? Como viveria a Igreja com um chefe que passaria rapidamente de grande lider a doente coitadinho de quem se teria muita pena? O que aliás, de certo modo, já tem vindo a acontecer quando na maioria dos discursos do padres portugueses se nota uma tónica defensora do que João Paulo II fez e foi, que, mesmo sem que haja intenção, denota que o que defendem não é afinal inequívoco, claro e grandioso aos olhos de todos, caso contrário, seria dispensada a mesma defesa. A presença física de Wojtyla na terra como Papa, a insistência no caminho até ao fim como Sumo Pontífice, as 133 viagens, as 31 (?) voltas à terra que estas representam em quilómetros, são aspectos impressionantes demasiado concretos, demasiado visíveis, muito agradáveis às multidões de crentes que fazem hoje a Igreja. Tão visíveis como o "reino dos céus" ou "as trevas" que ainda ouvimos dos párocos aos Domingos: a prova de que a Igreja, com o seu Papa, tem ainda um longo percurso a percorrer no sentido da espiritualidade. Para que os católicos deixem de ser perseguidos pela oposição ao uso do preservativo, mas pela mensagem suprema do amor que Cristo ensinou, como verdade que afronta por ser pura e brutalmente inequívoca.

sexta-feira, abril 01, 2005

Karol Wojtyla

O mundo cristão ( e não só...) está suspenso, com os olhos postos no Vaticano.
Para crentes e não crentes, católicos praticantes ou não, uma personalidade como esta é incontornável e apesar das posições polémicas que defendeu, nomeadamente quanto ao uso de contraceptivos, foi um dos maiores percursores da abertura da Igreja Católica a outras religiões, professando um ecumenismo exemplar, e teve uma notória influência na libertação de alguns países de Leste, principalmente a "sua" Polónia, do jugo de uma dura ditadura comunista, tornando-se uma das personalidades de relevo incontestável do séc. xx.
Outra das características mais vincadas do seu pontificado foi a sua preseverança, o modo como, até há pouco tempo atrás, levava a cabo os seus projectos, sendo a face mais visível deste seu carácter as visitas que fez a vários países onde nunca um representante supremo da Igreja teria sequer considerado dirigir-se, nomeadamente a diversas nações africanas e do Médio-Oriente, num exemplo de abertura e de busca de consensos, ao invés de acentuar as divergências doutrinais e ideológicas.
O instituição da Igreja mantém-se, no entanto, uma estrutura ainda bastante obsoleta, demonstrando uma incapacidade preocupante de se manter a par das imparáveis mudanças a que a sociedade comtemporânea é sujeita e de ser realmente a representante espiritual de tantos milhões espalhados pelo Mundo.
Professor e filósofo, mas acima de tudo Homem como todos nós, Karol Wojtyla deixará um legado, apesar de tudo, exemplar e difícil de igualar a quem quer que lhe venha a suceder, tendo dado passos importantes no sentido de aproximar a Igreja Católica da sua verdadeira essência : a confluência de ideias e credos e, acima de tudo o resto, o respeito pelo próximo.